Interpretação
em Hart
-direito
entendido como uma “textura aberta” (HART, O Conceito de Direito, p. 148)
-Hart
entende que como uma frase de uma língua, o que está expresso nas regras não
tem somente um significado, pois as palavras tem diversos significados e
diversas possiblidades de interpretação.
Texto; “Neste ponto, a linguagem geral
dotada de autoridade em que a regra é expressa pode guiar apenas um modo
incerto, tal como ocorre com um exemplo dotado de autoridade. O sentido em que
a linguagem de regra nos permitirá simplesmente escolher casos de aplicação
facilmente recognocíveis, esboroa-se neste ponto; a subsunção e a extração de
uma conclusão silogística já não caracterizam o cerne do raciocínio implicado
na determinação do que é a coisa concreta a fazer-se. Pelo contrário, a
linguagem da regra parece agora só delimitar um exemplo dotado de autoridade,
nomeadamente, o constituído pelo caso simples. Tal pode ser usado de forma
bastante semelhante à do precedente, embora a linguagem da regra limite os
aspectos que exigem atenção, não só de forma mais permanente, como de modo mais
preciso do que faz o precedente. (...) No caso das regras jurídicas, os
critérios de relevância e de proximidade da semelhança dependem de fatores
muito complexos que atravessam o sistema jurídico e das finalidades ou intenção
que possam ser atribuídos à regra. Caracterizá-los seria caracterizar tudo o
que é específico ou peculiar no raciocínio jurídico. Seja qual for o processo
escolhido, precedente ou legislação, para a comunicação de padrões de
comportamento, estes, não obstante a facilidade com que atuam sobre a grande massa
de casos correntes, revelar-se-ão como indeterminados em certo ponto em que a
sua aplicação esteja em questão; possuirão aquilo que foi designado como
textura aberta. Até aqui apresentamos tal, no caso da legislação como um
aspecto geral da linguagem humana, a incerteza na linha de fronteira é o preço
que deve ser pago pelo uso de determinados termos classificatórios gerais em
qualquer forma de comuinicação que respeito a questões de fato. As línguas
naturais como o inglês tem irredutivelmente uma textura aberta, quando usadas
desse modo.” (Hart. O conceito de direito, p, 141)
- juiz
tem atividade criadora, porque nem todos os casos estão nas leis. Há casos em
que os legisladores não previram.
Texto: “É um aspecto da condição
humana (e, por isso, da legislativa) que trabalhemos sob a influência de duas
desvantagens ligadas, sempre que procuramos regular, de forma não ambígua e
antecipadamente, alguma esfera da conduta por meio de padrões gerais a ser
usados, sem diretiva oficial ulterior, em ocasiões particulares. A primeira
desvantagem é a nossa relativa ignorância de fato, a segunda a nossa relativa
indeterminação de finalidade. Se o mundo em que vivemos fosse caracterizado só
por um número finito de aspectos e estes, conjuntamente com todos os modos por
que se podiam combinar, fossem por nós conhecidos, então poderia estatuir-se
antecipadamente para cada possibilidade. Poderíamos fazer regras cuja aplicação
a casos concretos nunca implicasse uma outra escolha. Tudo poderia ser
conhecido e, uma vez que poderia ser conhecido, poder-se-ia, relativamente a
tudo, fazer algo e especificá-lo antecipadamente através de uma regra. Isto
seria um mundo adequado a uma jurisprudência mecânica. Simplesmente este não é
o nosso mundo; os legisladores humanos não podem ter tal conhecimento de todas
as possíveis combinações de circunstâncias que o futuro pode trazer. Esta
incapacidade de antecipar acarreta consigo uma relativa indeterminação de
finalidade” (Hart. O conceito de Direito, p, 141)
- Para
diminuir essa indeterminação das regras, cria-se duas técnicas. A primeira
delas consiste no poder legislativo determinar regras diretivas para a
interpretação. A segunda técnica consiste em recorrer a juízos sobre o que é
razoável, buscando o equilíbrio.
Texto: “A textura aberta do direito
significa que há, na verdade, áreas de conduta em que muitas coisas devem ser
deixadas para serem desenvolvidas pelos tribunais ou pelos funcionários, os
quais determinam o equilíbrio, à luz das circunstâncias, entre interesses
conflitantes que variam em peso, de caso para caso. Seja como for, a vida do
direito traduz-se em larga medida na orientação, quer das autoridades, quer dos
indivíduos privados, através de regras determinadas que, diferentemente
das aplicações de padrões variáveis, não exigem deles uma apreciação nova de
caso para caso. Este fato saliente da vida social continua a ser verdadeiro,
mesmo que possam surgir incertezas relativamente à aplicabilidade de qualquer
regra (quer escrita, quer comunicada por precedente) a um caso concreto. Aqui,
na franja das regras e no campo deixado em aberto pela teoria dos precedentes,
os tribunais preenchem uma função criadora de regras que os organismo
administrativos executam de forma centralizada na elaboração de padrões
variáveis. Num sistema em que o stare decisis é firmemente reconhecido, esta
função dos tribunais é muito semelhante ao exercício de poderes delegados de
elaboração de regulamentos por um organismo administrativo. Em Inglaterra, este
fato é muitas vezes obscurecido pelas aparências: porque os tribunais
frequentemente negam qualquer função criadora desse tipo e insistem em que a
tarefa apropriada da interpretação da lei e do uso do precedente é,
respectivamente, procurar a “intenção do legislador” e o direito que já existe”
( Hart, O conceito de direito, p. 148-149)
*Direito
e Moral
-
“na visão de Hart, a moral e a obrigação moral são, em sua base, conceitos
sociais” (MackCormick. H.L.A.HART ,p, 67)
- Para
Hart, a moral é um outro tipo de regras, assim como o direito é um conjunto de
regras. Direito e moral se encontram no mesmo patamar. Direito e Moral são
regras sociais, são regras que são dadas pela linguagem.
- São
essas regras e princípios (standards) que permitem que os homens vivam
conjuntamente. Esses standards compartilhados são standards
morais,e conjuntamente formam uma moral que é uma moral social. Hart trata de
uma moral social e não de uma moral individual, por isso chama-se sua moral de
“moral positiva”.
- Hart
faz distinção entre “moral positiva” que é compartilhada por uma sociedade
daquilo que entende como regras morais.
Texto:
“Eu gostaria de recuperar a terminologia preferida pelos utilitaristas do
século passado, que distinguiam “moral positiva”, a moral de fato aceita e
compartilhada por um dado grupo social, dos princípios morais usados na crítica
das instituições sociais reais que incluem a moral social. Podemos chamar tais
princípios gerais de “moral crítica” (Hart. Direito, Liberdade, Moralidade.
Apud: MackCormick. H.L.A.HART ,p, 69)
-Moral
crítica é formada tanto de princípios gerais, como os da moral positiva, quanto
de princípios racionais. Esses princípios da razão remetem aos valores e ideais
de uma sociedade. Para Hart, os valores não são demonstráveis racionalmente,
mas também não são vontade arbitrária.
-Hart
diferencia as regras e os princípios. Essa diferenciação é um dos pontos que
Dworkin irá criticar na obra de Hart.
Texto: “ Em qualquer grande grupo, as
regras gerais, os padrões e os princípios devem ser o principal instrumento de controle
social, e não as diretivas particulares dadas separadamente a cada indivíduo.
Se não fosse possível comunicar padrões gerais de conduta que multidões de
indivíduos pudessem perceber, sem ulteriores diretivas, nada daquilo que agora
reconhecemos como direito poderia existir. Daí resulta que o direito deva
predominantemente, mas não de forma alguma exclusivamente, referir-se a
categorias de pessoas, e a categorias de atos, coisas e circunstâncias, e o seu
funcionamento com êxito sobre vastas áreas da vida social depende de uma
capacidade largamente difundida de reconhecer atos, coisas e circunstâncias
particulares como casos das classificações gerais que o direito faz.
Tem-se usado dois expedientes principais, à primeira vista muito diferentes um
do outro, para a comunicação de tais padrões gerais de conduta. Um deles faz um
uso máximo o outro faz um uso mínimo de palavras gerais a estabelecer
classificações. O primeiro é exemplificado por aquilo a que chamamos legislação
e o segundo pelo precedente. Podemos ver os aspectos que os distinguem nos
exemplos de casos não-jurídicos que a seguir apresentamos. Um pai antes de ir à
igreja diz ao filho: Todos os homens e os rapazes devem tirar o chapéu ao
entrar numa igreja. Outro diz; descobrindo a cabeça quando entra na igreja:
Olha, eis a forma correta de nos comportamos nestas ocasiões” (Hart, O conceito
de Direito, p, 137)
*Hart e o
Direito Natural
- Hart
fala de um núcleo de verdade inquestionável nas doutrinas de direito natural:
1)vulnerabilidade humana, 2)igualdade aproximada, 3)recursos limitados,
4)altruísmo limitado, 5)entendimento limitado e força de vontade.
Texto: “1)Vulnerabilidade humana.
Por vulnerabilidade humana, Hart deseja chamar a atenção para o fato de que, em
face das circunstâncias naturais em que nos encontramos, vivemos em situação de
extremo risco. Estamos em risco devido ao meio ambiente, e também devido aos
que nos cercam, que podem pretender nos prejudicar. Em termos gerais, não somos
totalmente protegidos contra nosso meio ambiente, tanto social quanto
naturalmente. Precisamos nos proteger, e o sistema jurídico é um dos mecanismo
aos quais recorremos em busca de proteção.
2)Igualdade
aproximada. Os seres humanos são aproximadamente iguais. Em outras palavras,
ainda que algumas pessoas sejam mais dotadas do que outras, ainda que haja, por
assim dizer, um espectro de realções humanas, este é relativamente estreito e
então, em termos gerais, estamos igual e mutuamente em risco. Se assim não
fosse, haveria uma série de grandes diferenças no modo como organizamos nossas
vidas. Teríamos de pensar em nós próprios de um modo diferente daquele como nos
percebemos. Se houvesse diferenças muito mais fortes entre os seres humanos, se
pessoas muito fortes fossem ainda amis fortes e pessoas fracas ainda mais
fracas, então poderíamos ter achado difícil justificar os tipos de elementos de
controle que têm sido usados na sociedade a fim de aplainar nossas diferenças.
Ao fim e ao cabo, poderíamos achar difícil persuadir os que são excessivamente
fortes e aceitar as limitações que os sistemas jurídicos resolveriam impor a
suas aptidões. Não obstante, precisamos ter consciência do fato de que elas
podem ser inadequadas.
3)Recursos
Limitados. Não há recursos suficientes para todos. Esse é mais um problema da
escassez absoluta e de distribuição; existe um número limitado de recursos de
um tipo particular, e competimos por eles; portanto, precisamos de mecanismos
que assegurem que a concorrência não provoque reações que resultem em caos
social. Na verdade, Hart está chamando a nossa atenção para o fato de que
precisamos de algum mecanismo especificamente devido a um fato natural sobre o
mundo natural: o fato de que não temos livre acesso a tudo de que necessitamos
porque os recursos são limitados. Segue-se dai que, em épocas e lugares nos
quais determinados recursos não forem escassos, podemos esperar que uma análise
diferente se aplique.
4)Altruísmo
limitado. Há, aqui, dosi aspectos. (i) os seres humanos são, de fato
altruístas. Em determinados lugares e ocasiões, eles tencionam agir mais no
interesse dos outros do que no de si próprios. Precisamos levar isso em conta
em diferentes esquemas de administração, mas (ii)também ter em mente o fato de
que, muito embora os seres humanos sejam altruístas, eles assim se comportam de
modo muito irregular. Não podemos contar com pessoas que agem o tempo todo em
função do bem-estar de seu semelhante. Mais importante ainda, não podemos nos
esquecer de que o motivo de elas agirem de modo altruísta encontra-se muitas
vezes no fato de esperarem que, se agirem bem com os touros eles irão retribuir
com a mesma moeda. Assim, embora pudéssemos ter alguma expectativa de que os
seres humanos se comportem bem entre si, precisamos levar em consideração a
aplicação irregular desse truísmo.
5)Limite
de entendimento e força de vontade. Isso significa, na verdade, que nem sempre
sabemos o que é bom para nós. Em outras palavras, nem sempre sabemos que
devemos fazer em atendimento aos nossos próprios interesses. Além do mais,
mesmo quando compreendemos nossos melhores interesses, podemos não estar em
condições de fazer o que é preciso” (MORRISON, Wayne. Filosofia do
direito: dos gregos ao pós-modernismo, p, 447-448)
-um
sistema que não observasse esse núcleo, para Hart, dificilmente seria
identificado como um sistema jurídico.
-nada
garante que seguindo esses núcleos haja justiça.
- Os
núcleos de verdade inquestionável funcionam como premissas para Hart
explicar sua teoria do direito. Premissas significam a proposição, as
informações essenciais que servem de base para um raciocínio.
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