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sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Filosofia do Direito - Aula 9



Interpretação em Hart

-direito entendido como uma “textura aberta”  (HART, O Conceito de Direito, p. 148)
-Hart entende que como uma frase de uma língua, o que está expresso nas regras não tem somente um significado, pois as palavras tem diversos significados e diversas possiblidades de interpretação. 

Texto; “Neste ponto, a linguagem geral dotada de autoridade em que a regra é expressa pode guiar apenas um modo incerto, tal como ocorre com um exemplo dotado de autoridade. O sentido em que a linguagem de regra nos permitirá simplesmente escolher casos de aplicação facilmente recognocíveis, esboroa-se neste ponto; a subsunção e a extração de uma conclusão silogística já não caracterizam o cerne do raciocínio implicado na determinação do que é a coisa concreta a fazer-se. Pelo contrário, a linguagem da regra parece agora só delimitar um exemplo dotado de autoridade, nomeadamente, o constituído pelo caso simples. Tal pode ser usado de forma bastante semelhante à do precedente, embora a linguagem da regra limite os aspectos que exigem atenção, não só de forma mais permanente, como de modo mais preciso do que faz o precedente. (...) No caso das regras jurídicas, os critérios de relevância e de proximidade da semelhança dependem de fatores muito complexos que atravessam o sistema jurídico e das finalidades ou intenção que possam ser atribuídos à regra. Caracterizá-los seria caracterizar tudo o que é específico ou peculiar no raciocínio jurídico. Seja qual for o processo escolhido, precedente ou legislação, para a comunicação de padrões de comportamento, estes, não obstante a facilidade com que atuam sobre a grande massa de casos correntes, revelar-se-ão como indeterminados em certo ponto em que a sua aplicação esteja em questão; possuirão aquilo que foi designado como textura aberta. Até aqui apresentamos tal, no caso da legislação como um aspecto geral da linguagem humana, a incerteza na linha de fronteira é o preço que deve ser pago pelo uso de determinados termos classificatórios gerais em qualquer forma de comuinicação que respeito a questões de fato. As línguas naturais como o inglês tem irredutivelmente uma textura aberta, quando usadas desse modo.” (Hart. O conceito de direito, p, 141)

- juiz tem atividade criadora, porque nem todos os casos estão nas leis. Há casos em que os legisladores não previram.

Texto: “É um aspecto da condição humana (e, por isso, da legislativa) que trabalhemos sob a influência de duas desvantagens ligadas, sempre que procuramos regular, de forma não ambígua e antecipadamente, alguma esfera da conduta por meio de padrões gerais a ser usados, sem diretiva oficial ulterior, em ocasiões particulares. A primeira desvantagem é a nossa relativa ignorância de fato, a segunda a nossa relativa indeterminação de finalidade. Se o mundo em que vivemos fosse caracterizado só por um número finito de aspectos e estes, conjuntamente com todos os modos por que se podiam combinar, fossem por nós conhecidos, então poderia estatuir-se antecipadamente para cada possibilidade. Poderíamos fazer regras cuja aplicação a casos concretos nunca implicasse uma outra escolha. Tudo poderia ser conhecido e, uma vez que poderia ser conhecido, poder-se-ia, relativamente a tudo, fazer algo e especificá-lo antecipadamente através de uma regra. Isto seria um mundo adequado a uma jurisprudência mecânica. Simplesmente este não é o nosso mundo; os legisladores humanos não podem ter tal conhecimento de todas as possíveis combinações de circunstâncias que o futuro pode trazer. Esta incapacidade de antecipar acarreta consigo uma relativa indeterminação de finalidade” (Hart. O conceito de Direito, p, 141)

- Para diminuir essa indeterminação das regras, cria-se duas técnicas. A primeira delas consiste no poder legislativo determinar regras diretivas para a interpretação. A segunda técnica consiste em recorrer a juízos sobre o que é razoável, buscando o equilíbrio.

Texto: “A textura aberta do direito significa que há, na verdade, áreas de conduta em que muitas coisas devem ser deixadas para serem desenvolvidas pelos tribunais ou pelos funcionários, os quais determinam o equilíbrio, à luz das circunstâncias, entre interesses conflitantes que variam em peso, de caso para caso. Seja como for, a vida do direito traduz-se em larga medida na orientação, quer das autoridades, quer dos indivíduos privados, através de regras determinadas  que, diferentemente das aplicações de padrões variáveis, não exigem deles uma apreciação nova de caso para caso. Este fato saliente da vida social continua a ser verdadeiro, mesmo que possam surgir incertezas relativamente à aplicabilidade de qualquer regra (quer escrita, quer comunicada por precedente) a um caso concreto. Aqui, na franja das regras e no campo deixado em aberto pela teoria dos precedentes, os tribunais preenchem uma função criadora de regras que os organismo administrativos executam de forma centralizada na elaboração de padrões variáveis. Num sistema em que o stare decisis é firmemente reconhecido, esta função dos tribunais é muito semelhante ao exercício de poderes delegados de elaboração de regulamentos por um organismo administrativo. Em Inglaterra, este fato é muitas vezes obscurecido pelas aparências: porque os tribunais frequentemente negam qualquer função criadora desse tipo e insistem em que a tarefa apropriada da interpretação da lei e do uso do precedente é, respectivamente, procurar a “intenção do legislador” e o direito que já existe” ( Hart, O conceito de direito, p. 148-149)

*Direito e Moral
-  “na visão de Hart, a moral e a obrigação moral são, em sua base, conceitos sociais” (MackCormick. H.L.A.HART  ,p, 67)
- Para Hart, a moral é um outro tipo de regras, assim como o direito é um conjunto de regras. Direito e moral se encontram no mesmo patamar. Direito e Moral são regras sociais, são regras que são dadas pela linguagem.
- São essas regras e princípios (standards) que permitem que os homens vivam conjuntamente.  Esses standards compartilhados  são standards morais,e conjuntamente formam uma moral que é uma moral social. Hart trata de uma moral social e não de uma moral individual, por isso chama-se sua moral de “moral positiva”.
- Hart faz distinção entre “moral positiva” que é compartilhada por uma sociedade daquilo que entende como regras morais.
Texto: “Eu gostaria de recuperar a terminologia preferida pelos utilitaristas do século passado, que distinguiam “moral positiva”, a moral de fato aceita e compartilhada por um dado grupo social, dos princípios morais usados na crítica das instituições sociais reais que incluem a moral social. Podemos chamar tais princípios gerais de “moral crítica” (Hart. Direito, Liberdade, Moralidade. Apud: MackCormick. H.L.A.HART  ,p, 69)
-Moral crítica é formada tanto de princípios gerais, como os da moral positiva, quanto de princípios racionais. Esses princípios da razão remetem aos valores e ideais de uma sociedade. Para Hart, os valores não são demonstráveis racionalmente, mas também não são vontade arbitrária.
-Hart diferencia as regras e os princípios. Essa diferenciação é um dos pontos que Dworkin irá criticar na obra de Hart.

Texto: “ Em qualquer grande grupo, as regras gerais, os padrões e os princípios devem ser o principal instrumento de controle social, e não as diretivas particulares dadas separadamente a cada indivíduo. Se não fosse possível comunicar padrões gerais de conduta que multidões de indivíduos pudessem perceber, sem ulteriores diretivas, nada daquilo que agora reconhecemos como direito poderia existir. Daí resulta que o direito deva predominantemente, mas não de forma alguma exclusivamente, referir-se a categorias de pessoas, e a categorias de atos, coisas e circunstâncias, e o seu funcionamento com êxito sobre vastas áreas da vida social depende de uma capacidade largamente difundida de reconhecer atos, coisas e circunstâncias particulares como casos das classificações gerais que o direito faz.  Tem-se usado dois expedientes principais, à primeira vista muito diferentes um do outro, para a comunicação de tais padrões gerais de conduta. Um deles faz um uso máximo o outro faz um uso mínimo de palavras gerais a estabelecer classificações. O primeiro é exemplificado por aquilo a que chamamos legislação e o segundo pelo precedente. Podemos ver os aspectos que os distinguem nos exemplos de casos não-jurídicos que a seguir apresentamos. Um pai antes de ir à igreja diz ao filho: Todos os homens e os rapazes devem tirar o chapéu ao entrar numa igreja. Outro diz; descobrindo a cabeça quando entra na igreja: Olha, eis a forma correta de nos comportamos nestas ocasiões” (Hart, O conceito de Direito, p, 137)

*Hart e o Direito Natural
- Hart fala de um núcleo de verdade inquestionável nas doutrinas de direito natural: 1)vulnerabilidade humana, 2)igualdade aproximada, 3)recursos limitados, 4)altruísmo limitado, 5)entendimento limitado e força de vontade.

Texto:  “1)Vulnerabilidade humana. Por vulnerabilidade humana, Hart deseja chamar a atenção para o fato de que, em face das circunstâncias naturais em que nos encontramos, vivemos em situação de extremo risco. Estamos em risco devido ao meio ambiente, e também devido aos que nos cercam, que podem pretender nos prejudicar. Em termos gerais, não somos totalmente protegidos contra nosso meio ambiente, tanto social quanto naturalmente. Precisamos nos proteger, e o sistema jurídico é um dos mecanismo aos quais recorremos em busca de proteção.
2)Igualdade aproximada. Os seres humanos são aproximadamente iguais. Em outras palavras, ainda que algumas pessoas sejam mais dotadas do que outras, ainda que haja, por assim dizer, um espectro de realções humanas, este é relativamente estreito e então, em termos gerais, estamos igual e mutuamente em risco. Se assim não fosse, haveria uma série de grandes diferenças no modo como organizamos nossas vidas. Teríamos de pensar em nós próprios de um modo diferente daquele como nos percebemos. Se houvesse diferenças muito mais fortes entre os seres humanos, se pessoas muito fortes fossem ainda amis fortes e pessoas fracas ainda mais fracas, então poderíamos ter achado difícil justificar os tipos de elementos de controle que têm sido usados na sociedade a fim de aplainar nossas diferenças. Ao fim e ao cabo, poderíamos achar difícil persuadir os que são excessivamente fortes e aceitar as limitações que os sistemas jurídicos resolveriam impor a suas aptidões. Não obstante, precisamos ter consciência do fato de que elas podem ser inadequadas.
3)Recursos Limitados. Não há recursos suficientes para todos. Esse é mais um problema da escassez absoluta e de distribuição; existe um número limitado de recursos de um tipo particular, e competimos por eles; portanto, precisamos de mecanismos que assegurem que a concorrência não provoque reações que resultem em caos social. Na verdade, Hart está chamando a nossa atenção  para o fato de que precisamos de algum mecanismo especificamente devido a um fato natural sobre o mundo natural: o fato de que não temos livre acesso a tudo de que necessitamos porque os recursos são limitados. Segue-se dai que, em épocas e lugares nos quais determinados recursos não forem escassos, podemos esperar que uma análise diferente se aplique.
4)Altruísmo limitado. Há, aqui, dosi aspectos. (i) os seres humanos são, de fato altruístas. Em determinados lugares e ocasiões, eles tencionam agir mais no interesse dos outros do que no de si próprios. Precisamos levar isso em conta em diferentes esquemas de administração, mas (ii)também ter em mente o fato de que, muito embora os seres humanos sejam altruístas, eles assim se comportam de modo muito irregular. Não podemos contar com pessoas que agem o tempo todo em função do bem-estar de seu semelhante. Mais importante ainda, não podemos nos esquecer de que o motivo de elas agirem de modo altruísta encontra-se muitas vezes no fato de esperarem que, se agirem bem com os touros eles irão retribuir com a mesma moeda. Assim, embora pudéssemos ter alguma expectativa de que os seres humanos se comportem bem entre si, precisamos levar em consideração a aplicação irregular desse truísmo.
5)Limite de entendimento e força de vontade. Isso significa, na verdade, que nem sempre sabemos o que é bom para nós. Em outras palavras, nem sempre sabemos que devemos fazer em atendimento aos nossos próprios interesses. Além do mais, mesmo quando compreendemos nossos melhores interesses, podemos não estar em condições de fazer o que é preciso”  (MORRISON, Wayne. Filosofia do direito: dos gregos ao pós-modernismo, p, 447-448)

-um sistema que não observasse esse núcleo, para Hart, dificilmente seria identificado como um sistema jurídico.
-nada garante que seguindo esses núcleos haja justiça.
- Os núcleos de verdade inquestionável funcionam como premissas para Hart explicar sua teoria do direito.  Premissas significam a proposição, as informações essenciais que servem de base para um raciocínio.

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